Velho Tronco - Hemetério Cabrinha
Olha esse tronco de árvore esgalhado,
levado à toa pela correnteza.
Quem nos sabe contar o seu passado?
Quem nos diz sua história? Com certeza
Floriu, frutificou, teve seu fado,
foi luz, foi pão, foi ouro, foi grandeza,
teve um viver de inveja saturado,
foi um sorriso aberto à natureza.
Vê! como ele vai sereno, a esmo,
arrastando o cadáver de si mesmo
para um destino torturante, triste...
No entanto, quantas vezes não enchera
de frutos bons, a mão que o abatera!
...Como esse tronco muita gente existe!
Convicção - Hemetério Cabrinha
Tenho a certeza de já ter vivido
Através de outros mundos, de outras eras;
Na rude embriogenia das moneras,
Microcósmicamente impercebido.
Grão de pó entre abismos e crateras,
Nos turvos elementos confundido.
Hei por milhões de séculos sofrido
Entre minérios, vegetais e feras.
Rolei no caos da natureza bruta,
Conseguindo, através de intensa luta,
Chegar à borda dêste humano abismo.
Partícula do Todo simplesmente,
Mas já sentindo no evolver da mente
A razão dêste eterno transformismo.
De onde Venho? - Hemetério Cabrinha
Da grande Fôrça universal procedo
E venho de outras vidas, de outros mundos;
Por indisíveis dédalos profundos
Inconscientemente me enveredo.
Às minúsculas formas antecedo:
Da vibração aos corpos mais fecundos.
Transformando-me todos os segundos,
"Mergulhado no cósmico segrêdo".
Sou, para os sábios da moderna ciência,
Um simples animal que tem consciência,
Vivendo apenas entre o berço e a cova...
Entretanto, através do próprio lôdo,
Todo o universo se transforma, todo,
E a própria Eternidade se renova.
Falando a meu coveiro
É aqui neste lugar, ao pé deste cipreste,
junto a este mausoléu. Pega uma enxada, cava
sete palmas de chão! Anda depressa, grava
no teu semblante mudo o riso que escondeste!
Abre o meu leito eterno... O meu lugar é este!
Quero nele abafar minha paixão escrava!
Quero enterrar-me logo... a vida já me agrava...
Depressa! A minha dor de dores se reveste!
Alarga-a mais um pouco, afasta mais a areia!
Ela, assim como está, torna-se muito feia, profunda-a mais... trabalha! Este dinheiro é teu!
Que é isso? Um crânio aí? Dá-mo, quero beijá-lo.
Limpa-lhe bem o pó! Dá cá, quero estudá-lo
Como alguém algum dia há de estudar o meu!
(Vereda iluminada! 1932
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O Cristo do Corcovado
No
escalavrado píncaro da serra,
Que o
luar alveja e a luz do sol estanha;
E onde
a cidade, abençoando a terra,
Se
espreguiça na falda da montanha;
Ergue-se
o Cristo-Redentor, coitado!
Braços
ao ar, o triste olhar cravado
Na base
de granito que o suporta
De alma
apagada e a consciência morta.
O
Cristo cujo busto alvinitente,
Granítico,
imponente
E
lavado de sol;
Aureolando
de alvura o Corcovado,
Qual
Prometeu, virado
Para o
horizonte, a medir o arrebol;
E, de
distância imensurável, visto
Qual
uma forma etérea
É
apenas um Cristo
Feito à
custa de angústias e miséria.
Se o
Cristo real, na sua pura essência,
Inebriado
de amor e de demência,
Dos
céus viesse e visse a sua imagem
Naquela
pétrea e estúpida roupagem!
—Monstrengo
exposto
Ao sol,
à chuva, à neve, á ventania,
Tendo a
seus pés um povo em agonia;
Em seu
cândido rosto
De
Santo deixaria
Mil
lágrimas de fel correrem doloridas,
E de
olhos para os céus,
E de
mãos estendidas
Para
Deus,
Numa
exortante súplica sem fim,
A
Escribas e Fariseus,
Calmo e
sereno, falaria assim:
—Quando
vim entre vós, há quase dois mil anos,
Sem ter
onde pousar a fronte iluminada;
Saturando
de amor os corações humanos
E
chamando ao redil a ovelha tresmalhada;
.............................................
Ninguém
me compreendeu, ninguém quis escutar-me,
E numa
sanha hostil, num tresloucado alarme
Levaram-me
ao Calvário... Em hórridos baldões,
Deram-me,
após magoar-me, a morte entre ladrões.
Só
porque muito amei os pobres sem mansarda
Que a
maldade feral do mundo os acobarda
E lança
á execração Em minha singeleza,
Prometi-lhes
o céu em troca da pobreza;
Elevando-lhes
a alma aos páramos divinos;
Ao meu
seio chamando os vis, os pequeninos,
Os que
vivem na terra amarguradamente
Atirados
ao léu, num desprezo inclemente,
Sob o
azorrague atroz dos maus, dos impudicos
Que
pensam Deus haver apenas para os ricos.
Para
levar a luz da fé por toda a parte,
E fazer
drapejar meu celeste estandarte,
A quem
fui eu buscar com infinito amor?
A uma
mulher perdida e um simples pescador.
À
perdida - Magdala - abri meu coração
E a
minha alma ofertei ao pescador Simão
Simão,
que sem burel, cetro, trono ou tiara,
Iletrado
e plebeu, de amor se iluminara
Por
mim, na terra foi da caridade o exemplo;
Numa
velha palhoça erigiu o meu templo,
Pondo,
nele, em lugar de altares e esplendores,
Catres,
para acolher humildes sofredores. .
A moeda
que caía em seu fardel de esmola,
Com a
bondade dos céus que os santos aureola,
Era
qual grão de trigo ao bom pão levedado,
Para
matar a fome e a dor do desgraçado.
Foi
assim que pedi nas horas de agonia;
Foi
assim que ensinei, era assim que eu queria
Que se
fizesse sempre em meu nome. Entretanto,
Dois
séculos depois, meu Evangelho Santo
Sumia-se
no vai dos baixos egoísmos.
E,
cavando entre mim e a nova fé abismos,
Os
servos da ambição, numa luta assassina,
Mancharam
a pureza excelsa da Doutrina;
Perseguindo,
matando e roubando em meu nome,
Levaram
meus fiéis á cremalheira, à fome.
Dando
aos que muito amei a cicuta, o falemo,
E em
negra ‘Inquisição” o imaginado inferno...
E para
impressionar, abismar, deslumbrar,
Ergueram
em cada canto um palácio e um altar
Fulgentes
de européis e fina pedraria,
Enquanto
os bons cristãos sucumbem de agonia.
Ergueram,
para quê, no alto do Corcovado
Minha
estátua? - se em tomo há tanto desgraçado
Que se
pede em meu nome a paz para aflição,
Em meu
nome recebe, em troca, a maldição?
Para
que o esplendor de régio monumento
Se de
dor me perturba o humano sofrimento?
Não vos
disse a vibrar em meu amor fecundo,
Que meu
reino imortal não era deste mundo?
Das
arcas arrancai o tesouro guardado
E ide!
Ide buscar a todo o desgraçado,
Que é filho
de meu Pai e também nosso irmão,
Dando-lhe
o pão do corpo, a paz do coração,
A luz
da consciência! . .. E onde ouvirdes um ai,
Com
desmedido amor do infortúnio arrancai
Essa
alma a se estorcer nos desesperos seus,
E em
memória de mim, erguei-a para Deus!
E
manso, humilde e bom; cheio de amor e luz,
Era
assim que diria o angélico JESUS.
(O
Cristo do Corcovado/1952)
-----------------------------
A Pororoca
Hemetério Cabrinha (1892-1959)
Calmo, sereno, plácido, espelhante,
Nas horas de luar, frias e brancas,
O Mearim, gargalhando nas barrancas,
Se estende, estica e perde-se distante.
O céu, como uma concha de safira
Emborcada por toda a Natureza,
Enche a paisagem de real grandeza
Enquanto o rio pelo chão se estira.
A floresta conserva-se parada;
Nenhuma folha quebra-lhe o silêncio.
E o intérmino trajeto, o rio vence-o
Calmo dentro da noite enluarada.
Mas, um rumor, ao longe, de repente,
Ecoando à distância, estruge, esturra...
Uma invisível força o rio empurra
De encontro às margens assombrosamente.
As águas fervem, tumultuam, crescem
Alagando, destruindo, aniquilando,
Num furor infernal arrebatando
Árvores altas que nas águas descem.
As raízes do solo se deslocam
Sob a fúria dos bruscos elementos.
Ondas revoltas, vagalhões violentos,
Na agonia das margens se rebolam.
Em derredor das ribeirinhas zonas
Nada fica que o rio não ameace;
Como se no seu dorso galopasse
Um tropel de raivosas amazonas.
Embarcações desgarram-se, afundando,
Quebrando amarras, rebentando mastros.
E a Pororoca, em seus sinistros rastros,
Rola por entre abismos esturrando.
Depois... Volta o silêncio. O rio desce;
Plácido e manso o curso continua.
Enquanto branca e só se esconde a lua
Como se nada acontecido houvesse...
Mesmo assim somos nós, nas nossas trocas
De amores e emoções. Tranquilamente,
Quando mal esperamos, de repente
Rebentam n’alma doidas pororocas.
Quem Fui e o Que Serei
Fui húmus, fui cristal, fui pedra bruta,
E nas substâncias da matéria inerme,
Vim desde a vibração ao paquiderme,
Após milhões de séculos de luta.
Monera, larva, lama, lêsma, verme
Fui, (para a expansão da Causa Absoluta
De onde a vida nos corpos se transmuta)
Até sentir calor na minha derme.
Na transcendente hereditariedade,
A minha rude personalidade
Chegou a ser o que é na vida hodierna...
E daqui para além irei seguindo,
Evoluindo sempre, evoluindo
Até chegar à Perfeição Eterna.
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Convicção
Tenho a certeza de já ter vivido
Através de outros mundos, de outras eras;
Na rude embriogenia das moneras,
Microcósmicamente impercebido.
Grão de pó entre abismos e crateras,
Nos turvos elementos confundido.
Hei por milhões de séculos sofrido
Entre minérios, vegetais e feras.
Rolei no caos da natureza bruta,
Conseguindo, através de intensa luta,
Chegar à borda dêste humano abismo.
Partícula do Todo simplesmente,
Mas já sentindo no evolver da mente
A razão dêste eterno transformismo.
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De onde Venho?
Da grande Fôrça universal procedo
E venho de outras vidas, de outros mundos;
Por indisíveis dédalos profundos
Inconscientemente me enveredo.
Às minúsculas formas antecedo:
Da vibração aos corpos mais fecundos.
Transformando-me todos os segundos,
"Mergulhado no cósmico segrêdo".
Sou, para os sábios da moderna ciência,
Um simples animal que tem consciência,
Vivendo apenas entre o berço e a cova...
Entretanto, através do próprio lôdo,
Todo o universo se transforma, todo,
E a própria Eternidade se renova.
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A Pororoca
Calmo, sereno, plácido, espelhante,
Nas horas de luar, frias e brancas,
O Mearim, gargalhando nas barrancas,
Se estende, estica e perde-se distante.
O céu, como uma concha de safira
Emborcada por toda a Natureza,
Enche a paisagem de real grandeza
Enquanto o rio pelo chão se estira.
A floresta conserva-se parada;
Nenhuma folha quebra-lhe o silêncio.
E o intérmino trajeto, o rio vence-o
Calmo dentro da noite enluarada.
Mas, um rumor, ao longe, de repente,
Ecoando à distância, estruge, esturra...
Uma invisível força o rio empurra
De encontro às margens assombrosamente.
As águas fervem, tumultuam, crescem
Alagando, destruindo, aniquilando,
Num furor infernal arrebatando
Árvores altas que nas águas descem.
As raízes do solo se deslocam
Sob a fúria dos bruscos elementos.
Ondas revoltas, vagalhões violentos,
Na agonia das margens se rebolam.
Em derredor das ribeirinhas zonas
Nada fica que o rio não ameace;
Como se no seu dorso galopasse
Um tropel de raivosas amazonas.
Embarcações desgarram-se, afundando,
Quebrando amarras, rebentando mastros.
E a Pororoca, em seus sinistros rastros,
Rola por entre abismos esturrando.
Depois... Volta o silêncio. O rio desce;
Plácido e manso o curso continua.
Enquanto branca e só se esconde a lua
Como se nada acontecido houvesse...
Mesmo assim somos nós, nas nossas trocas
De amores e emoções. Tranqüilamente,
Quando mal esperamos, de repente
Rebentam n’alma doidas pororocas.
Velho tronco
Olha esse tronco de árvore esgalhado,
levado à toa pela correnteza.
Quem nos sabe contar o seu passado?
Quem nos diz sua história? Com certeza
Floriu, frutificou, teve seu fado,
foi luz, foi pão, foi ouro, foi grandeza,
teve um viver de inveja saturado,
foi um sorriso aberto à natureza.
Vê! como ele vai sereno, a esmo,
arrastando o cadáver de si mesmo
para um destino torturante, triste...
No entanto, quantas vezes não enchera
de frutos bons, a mão que o abatera!
...Como esse tronco muita gente existe!
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De onde Venho?
Da grande Fôrça universal procedo
E venho de outras vidas, de outros mundos;
Por indisíveis dédalos profundos
Inconscientemente me enveredo.
Às minúsculas formas antecedo:
Da vibração aos corpos mais fecundos.
Transformando-me todos os segundos,
"Mergulhado no cósmico segrêdo".
Sou, para os sábios da moderna ciência,
Um simples animal que tem consciência,
Vivendo apenas entre o berço e a cova...
Entretanto, através do próprio lôdo,
Todo o universo se transforma, todo,
E a própria Eternidade se renova.
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Geminidade
Numa gôta de orvalho escassa, cintilante,
Há um mundo a rolar latente, palpitante
Em sua pequenez etérea, cristalina,
Que à luz do sol parece estrêla, diamantina;
Há um beijo de Deus para exaltar a vida...
E essa gôta do céu, na pétala caída,
Vivificando a planta e colorindo a flor,
Tem para a Natureza uma expansão de amor.
Assim também o pranto -- a lágrima tremente --
Como a gôta de orvalho, a derramar-se quente
De uns olhos cujo encanto a sobra da tristeza
Apagou, para dar emocional beleza
Que só a dor profunda esboça, plasma, imprime;
Traz em seu cintilar o que há de mais sublime
Nos refolhos sutís da alma desolada;
E num rosto ou num colo ebúrneo derramada,
Como o orvalho do céu, esplende em seu fulgor,
Um ósculo de Deus na exaltação da dor.
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A Pororoca
Calmo, sereno, plácido, espelhante,
Nas horas de luar, frias e brancas,
O Mearim, gargalhando nas barrancas,
Se estende, estica e perde-se distante.
O céu, como uma concha de safira
Emborcada por toda a Natureza,
Enche a paisagem de real grandeza
Enquanto o rio pelo chão se estira.
A floresta conserva-se parada;
Nenhuma folha quebra-lhe o silêncio.
E o intérmino trajeto, o rio vence-o
Calmo dentro da noite enluarada.
Mas, um rumor, ao longe, de repente,
Ecoando à distância, estruge, esturra...
Uma invisível força o rio empurra
De encontro às margens assombrosamente.
As águas fervem, tumultuam, crescem
Alagando, destruindo, aniquilando,
Num furor infernal arrebatando
Árvores altas que nas águas descem.
As raízes do solo se deslocam
Sob a fúria dos bruscos elementos.
Ondas revoltas, vagalhões violentos,
Na agonia das margens se rebolam.
Em derredor das ribeirinhas zonas
Nada fica que o rio não ameace;
Como se no seu dorso galopasse
Um tropel de raivosas amazonas.
Embarcações desgarram-se, afundando,
Quebrando amarras, rebentando mastros.
E a Pororoca, em seus sinistros rastros,
Rola por entre abismos esturrando.
Depois... Volta o silêncio. O rio desce;
Plácido e manso o curso continua.
Enquanto branca e só se esconde a lua
Como se nada acontecido houvesse...
Mesmo assim somos nós, nas nossas trocas
De amores e emoções. Tranqüilamente,
Quando mal esperamos, de repente
Rebentam n’alma doidas pororocas.
(Frontões)
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Pátria
Hemetério Cabrinha
Pátria – é o azul deste céu – cetim que nos orgulha.
É o amor de nossa mãe a cantar dentro d’alma.
É a saudade do berço. É a vaga que marulha,
Espuriamente e cruel, sem destino e sem calma!
É a sublime expressão do idioma que falamos,
Uns farrapos de luz em nossos olhos baços.
É o sabiá despertando a harmonia nos ramos
Quando o sol lança, no ar, seus primitivos traços!
É a ênfase divinal de um sonho imorredoiro,
Arrancando orações do nosso lábio mudo.
É este imenso rincão emoldurado em oiro...
Este solo abrasado e em berço de veludo!
É o Amazonas, brutal, essecoleando ansioso
Ora, revolto e mal; ora, em rumor de festas
Levando para o oceano outro mar caudaloso
Na saudade aromal destas verdes florestas.
É o mugido dos bois, no madrugar dos campos,
O arado do progresso, a gleba removendo.
É a noite a despertar milhões de pirilampos
Que, pelo escuro, vão sutis fosforescendo.
É o pendão auriverde a tremular nos mastros,
Panejando, soberbo, às carícias do vento...
São mil bustos de heróis, em plintos de alabastros,
São as bênçãos de luz do nosso pensamento.
É a voz do Rui Barbosa atravessando os Andes,
Portentosa e sublime, a proclamar Justiça!
É a conjunção do amor dos pequenos e grandes,
O morrer afrontando e em desbragada liça.
Pátria – é a luz deste sol que nos aquece os músculos!
É o filho que nos beija. É a mãe que nos consola.
É a apoteose do azul, em todos os crepúsculos.
É a choupana embolada, ao tilintar da viola,
É a rouxinolação dos pássaros em maio.
É o outono esmaltando as folhas do pau d’arco.
É a palmeira, a rolar, fulminada do raio.
É o coaxar dos répteis no marulho do charco.
São os galos “riscando” em madrugadas d’oiro,
Deslumbrados de vir encantados da aurora.
É a onça em disparada, ao mugido do toiro!
É o sorriso de alguém dentro da alma que chora.
A Pátria que conheço é tudo finalmente!
É o orgulho que eleva. É o amor que domina.
É aperola engastada, esbelta e refulgente
No invejável colar da América Latina.
Pátria – Brasil que adoro e me prende e reanima
Na magoada expressão de alguns olhos sem lume.
És meu verso cantando a epopéia da rima.
És a vida. És o amor. És o som e o perfume.
Quando eu sulcar da morte o ilimitado espaço,
Arrastando da vida o derradeiro anseio,
Pátria! Deixa dormir em teu livre regaço
O meu corpo gelado ao calor do teu seio!
O mundo me foi sempre avesso, duro, escasso:
Eu vivo como que entre tenazes de aço,
Sem direito a gemer nem desferir um grito.
O que me apraz, porém, anima-me, consola,
É ter esta amplidão azúlea por gaiola
E poder contemplar os astros no infinito.
Existem para mim só aflições extremas:
Meus punhos sentem sempre o jugo das algemas
Chumbadas às ambições dos baixos sentimentos.
Mas o que me enternece e deslumbra minhalma,
É conhecer a vida e conquistar a calma
Na divina expansão dos grandes sofrimentos.
Disseram que eu morrera. Ainda é tão cedo
Para deixar em paz o velho mundo,
Onde, por entre espinhos me enveredo.
Como um simples rafeiro vagabundo. rafeiro: cão
Bem quisera eu fugir deste degredo!
Deste terrível lupanar imundo, lupanar: prostíbulo
Onde, hoje, a vida é simplesmente o enredo
De um romance de fel e dor fecundo.
Para que viver mais, quem sobre os ombros,
A cruz da vida tem pesado tanto,
E trá-la a tropeçar por entre escombros?
Disseram que eu morrera. No entretanto,
Como um fantasma vil causando assombros
Ainda arrasto o cadáver por enquanto
Em Busca da Perfeição
A alma que busca exílio nas clausuras
Emotivas da vida transitória,
Traz em em sua odisséia, em sua história
As conseqüências das ações impuras.
Absorvida nas dores, nas torturas,
No desespero de uma luta inglória,
Percorre amargurada trajetória
Em sucessivas existências duras.
Reparando a fraqueza de seus atos,
Como cego levados pelos tatos,
Busca na treva a meta desejada.
Até que um dia, em vestes vaporosas,
Abre no espaço as asas luminosas
e conquista a Mansão Iluminada.
ENGANOS
Por que me deste sorrindo,
Tantos beijos, tanto amor?
E agora de mim fugindo,
Em meu seio vais abrindo
Uma cratera de dor?
Teu amor foi meu calvário,
Os teus braços minha cruz.
Teu coração, meu sacrário,
Teus lábios, meu breviário
E os teus olhos, minha luz.
Enleado em teu carinho,
Ocupei teu coração.
Hoje, tristonho e sozinho,
Sou um pássaro sem ninho,
Às tontas pela amplidão.
Vivi no teu pensamento
Como um sol de áureo matiz.
Eras o meu firmamento
E agora, no esquecimento,
Sou vaga-lume infeliz.
Idílio
Quando nós dois a sós nos encontramos,
As nossas almas lúbricas se beijam.
Rebentam rosas no verdor dos ramos
E aves em festa pelo azul voejam.
Tudo em torno de nós desperta e canta.
Canta e desperta anseios e desejos.
A Natureza, a rir de amor, se imanta
Na glorificação de nossos beijos.
O sol tem mais fulgor, a lua encanto;
As estrelas mais brilho, a flor, fragrância
E o nosso idílio emocionante e santo
Enche os espaços de emotivas ânsias.
Verdejam campos. Há prazer em tudo;
Rumorejam de amor fontes e lagos.
Franja-se o céu de alvíssimo veludo
Para testemunhar nossos afagos.
E os nossos corpos, de prazer sedentos,
Saturam-se de gozos e desejos;
Cada vez mais estreitam-se violentos
Numa explosão frenética de beijos.
CANÇÃO DO AMAZÔNIDA
Caboclo: – Nasci na selva
Onde canta o uirapuru.
Onde, no verde da relva,
Corre a alígera inhambu.
No meu tapiri de palha,
Onde o céu, à noite, o orvalha
E a luz da lua branqueia,
Passa o rio murmurando,
Pelos barrancos cantando
Mil canções à lua cheia.
Sou feliz, nada me falta
Dentro da selva bravia.
Se uma tristeza me assalta,
Logo me vem a alegria.
De manhã, quando me acordo,
Mil aventuras recordo
Ouvindo a onça rosnar.
No cheiro agreste da mata,
Minha vida se dilata
E então me ponho a cantar.
Quanta lindeza se encerra
No rincão onde nasci!
Se deus andou pela terra
Nasceu no meu tapiri.
Decerto, porque em tudo,
Desde a relva de veludo
À sombra dos igapós;
Há tanta beleza, há tanta,
Que Deus parece que canta
No eco de nossa voz.
O GRILO
Tenho um perseguidor incômodo, imprudente
Que me não deixa em paz, calmo e tranqüilo.
Esconde-se a cantar a um canto, impertinente,
E eu tenho que passar a noite inteira a ouvi-lo.
Se acaso me levanto e busco esse insolente,
Mudando de lugar ele emudece o trilo.
Enraiveço... Maldigo-o e, logo, novamente
Grita mais alto ainda... É um desgraçado grilo.
Hoje, pensando bem nesse irritante intruso
Cujo horrente trilar é um desmedido abuso
Provocando, afinal, a minha paciência;
Concluí: A mesma cousa à nossa alma acontece:
Após um ato mau o remorso aparece
Como o grilo a gritar dentro da consciência.
A ARANHA
Eu tenho uma fidalga e loira companheira
Que, sempre a meditar, de vê-la não me farto.
É um triste e sozinha aranha tecedeira,
Dia e noite a tecer labirintos no quarto.
Ora desce, ora sobe até a cumeeira;
Ora balouça no ar o seu trabalho infarto.
E, de fios de prata, a aranha fiandeira
Uma estrela bordou num ângulo do quarto.
Hoje, pela manhã, outra aranha doirada,
Num idílio de amor, de gozos saciada,
Lá morreu e ficou na teia cetinosa...
Assim mesmo acontece a todos nós, querida:
– Quem somente se entrega aos prazeres da vida,
Terá o mesmo fim da aranha desditosa.
PRETO VELHO
Preto velho está cansado,
Trôpego, exausto, sem fé.
Vem de longe, acabrunhado,
Lá de Luanda ou Guiné...
Já não sabe... Há quantos anos,
Um magote de tiranos
O trouxera de rojão.
No bojo esconso de um barco,
Como um batráquio no charco,
Nos ferros da escravidão.
Preto velho era menino,
Quando, em doirada manhã,
Alheio ao rude destino,
Brincava com sua irmã;
Três caçadores de gentes,
Naquelas paragens quentes
De sua terra natal.
Sorrateiros, se acercaram
Do preto e a irmã, e os laçaram
Como a qualquer animal
Enlaçados, sacudidos
No fundo da embarcação;
Entre gritos e gemidos
De uma negra multidão.
E quanto mais se gritava,
Duro chicote vibrava
Nos lombos nus a doer.
Era um inferno fervendo,
Uns gritando, outros gemendo
Na agonia de sofrer.
Em busca da perfeição
A alma que busca exílio nas clausuras
Emotivas da vida transitória,
Traz em sua odisseia, em sua história
As consequências das ações impuras.
Absorvida nas dores, nas torturas,
Nos desesperos de uma luta inglória,
Percorre amargurada trajetória
Em sucessivas existências duras.
Reparando a fraqueza de seus atos,
Como o cego levado pelos tatos,
Busca na treva a meta desejada.
Até que um dia, em vestes vaporosas,
Abre no espaço as asas luminosas
E conquista a Mansão Iluminada.
Por enquanto, não
Disseram que eu morrera. Ainda é tão cedo
Para deixar em paz o velho mundo,
Onde, por entre espinhos me enveredo,
Como um simples rafeiro vagabundo.
Bem quisera eu fugir deste degredo!
Deste terrível lupanar imundo,
Onde, hoje, a vida é simplesmente o enredo
De um romance de fel e dor fecundo.
Para que viver mais, quem sobre os ombros,
A cruz da vida tem pesado tanto,
E trá-la a tropeçar por entre escombros?
Disseram que eu morrera. No entretanto,
Como um fantasma vil causando assombros
Ainda arrasto o cadáver por enquanto.
HEMETÉRIO CABRINHA
Rogel Samuel
Talvez o leitor, a leitora, nunca tenha ouvido falar de Hemetério Cabrinha. É dele o soneto abaixo:
Falando a meu coveiro
É aqui neste lugar, ao pé deste cipreste,
junto a este mausoléu. Pega uma enxada, cava
sete palmas de chão! Anda depressa, grava
no teu semblante mudo o riso que escondeste!
Abre o meu leito eterno... O meu lugar é este!
Quero nele abafar minha paixão escrava!
Quero enterrar-me logo... a vida já me agrava...
Depressa! A minha dor de dores se reveste!
Alarga-a mais um pouco, afasta mais a areia!
Ela, assim como está, torna-se muito feia, profunda-a mais... trabalha! Este dinheiro é teu!
Que é isso? Um crânio aí? Dá-mo, quero beijá-lo.
Limpa-lhe bem o pó! Dá cá, quero estudá-lo
Como alguém algum dia há de estudar o meu!
(Vereda iluminada! 1932)
Ele era carpinteiro em Manaus, e viveu de 1892 a 1959.
Eu o conheci, já no fim da vida, na sede do jornal "A crítica". Eu era muito jovem.
Ele declamava um poema de Castro Alves, numa roda de linotipistas e jornalistas da época.
Era um homem simples, mas cheio de glória, majestade.
Parece que foi reeditado no Amazonas, também não sei.
O Soneto revela leitura de Shakespeare. Inclusive o "cipreste" é planta que nào creio que exista no Amazonas.
Alguns dos melhores momentos pós-parnasianos encontramos em sua poesia.
Dia virá em que os poetas parnasianos tardios serão valorizados.
No Brasil, o parnasiano avança e duvido que até hoje tenha ido embora.
Vemos o parnasianismo tardio até em João Cabral, Vinícius etc. Ser parnasiano, no Brasil, não deve ser pecado.
Cabrilha começa localizando o lugar: "É aqui neste lugar, ao pé deste cipreste, / junto a este mausoléu." E: " O meu lugar é este!"
As repetições de (4) "estes", aponta, funda, determina o seu leito de morte, a grandeza, o sublime que se acha em: " Abre o meu leito eterno..."
A ação operária se segue em : "Pega uma enxada, cava / sete palmas de chão!" E a ironia da situação aparece em: "Anda depressa, grava / no teu semblante mudo o riso que escondeste!"
Segue-se um momento de dramaticidade shakespeariana: " Quero nele abafar minha paixão escrava! / Quero enterrar-me logo... a vida já me agrava... / Depressa! A minha dor de dores se reveste!"
São versos fortes, que ultrapassam o nível de poeta de província que se supõe que ele seja.
Repare nas assonâncias em: enxada, cava, palmas, grava, escrava, agrava - o que revela a sua maestria verbal nas palavras que cercam o sêmen da palavra "enxada".
Diz o poeta: "... a vida já me agrava..." - ele vai morrer. Continua:
Alarga-a mais um pouco, afasta mais a areia!
Ela, assim como está, torna-se muito feia, profunda-a mais... trabalha! Este dinheiro é teu!
Ele paga ao coveiro. Com isso revoluciona. E vê o crânio.
Que é isso? Um crânio aí? Dá-mo, quero beijá-lo.
Limpa-lhe bem o pó! Dá cá, quero estudá-lo
Como alguém algum dia há de estudar o meu!
Eu não devia estar falando de política? Sim, e estou. Participando de um enterro...
De quê? De quem? Melhor não falar.
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A VISÃO DO MAR
Rogel Samuel
Mas não sei como poderia subsistir hoje sem a visão do mar, como nas “Palavras ao mar”, de Vicente de Carvalho:
“Mar, belo mar selvagem
Das nossas praias solitárias! Tigre
A que as brisas da terra o sono embalam,
A que o vento do largo eriça o pêlo!
Junto da espuma com que as praias bordas,
Pelo marulho acalentada, à sombra
Das palmeiras que arfando se debruçam
Na beirada das ondas - a minha alma
Abriu-se para a vida como se abre
A flor da murta para o sol do estio.”
Vicente de Carvalho, que era paulista, de Santos, assim o disse. Quando ele nasceu...
“Quando eu nasci, raiava
O claro mês das garças forasteiras:
Abril, sorrindo em flor pelos outeiros,
Nadando em luz na oscilação das ondas,
Desenrolava a primavera de ouro;
E as leves garças, como olhas soltas
Num leve sopro de aura dispersadas,
Vinham do azul do céu turbilhonando
Pousar o vôo à tona das espumas...”
Este hino ao mar, um dos melhores, amplo, sonoro, Vicente de Carvalho escreveu. Nasceu em abril, como diz o poema, no dia 5 de abril de 1856, “O claro mês das garças forasteiras / Abril, sorrindo em flor pelos outeiros, / Nadando em luz na oscilação das ondas”. Poeta feliz, ou melhor, da felicidade, da felicidade luminosamente azul:
“Sei que a ventura existe,
Sonho-a; sonhando a vejo, luminosa.
Como dentro da noite amortalhado
Vês longe o claro bando das estrelas;
Em vão tento alcançá-la, e as curtas asas
Da alma entreabrindo, subo por instantes...
O mar! A minha vida é como as praias,
E o sonho morre como as ondas voltam!”
Os olhos descansam na visão oceânica. Além disso, Vicente de Carvalho também foi aguerrido jornalista. Escrevia na imprensa, defendendo suas idéias. Foi deputado, Constituinte do Estado, em 1891. Seu ritmo é oral, como de tribuno, em:
“Mar, belo mar selvagem
Das nossas praias solitárias! Tigre
A que as brisas da terra o sono embalam,
A que o vento do largo eriça o pêlo!
Ouço-te às vezes revoltado e brusco,
Escondido, fantástico, atirando
Pela sombra das noites sem estrelas
A blasfêmia colérica das ondas...
Também eu ergo às vezes
Imprecações, clamores e blasfêmias
Contra essa mão desconhecida e vaga
Que traçou meu destino... Crime absurdo
O crime de nascer! Foi o meu crime.
E eu expio-o vivendo, devorado
Por esta angústia do meu sonho inútil.
Maldita a vida que promete e falta,
Que mostra o céu prendendo-nos à terra,
E, dando as asas, não permite o vôo!”
Em Santos ele faleceu. Em 22 de abril de 1924, aos 68 anos. Herdou o verso forte de Castro Alves. O verso: “A que as brisas da terra o sono embalam”, lembra o de Alves: “que a brisa do Brasil beija e balança”, em:
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Esta estrofe ousada, esta ousadia poética de Castro Alves, de rasgar a Bandeira Nacional num poema, poderia, em outros tempos, levá-lo à prisão. Entretanto vivia na liberdade de seu tempo democrático, heróico, nos versos decassílabos heróicos, com acentos 6 - 10: -------dão------ter / ----- sil ------ lan.
Auriverde penDÃO de minha TERra,
Que a brisa do BraSIL beija e baLANça
O Brasil oscila, ali. Aos ventos. Aquele navio cheio de escravos era bem brasileiro. Uma “vergonha”, diz ele. Lembro-me do poeta amazonense Hemetério Cabrinha a recitar, na Rua Saldanha Marinho, em Manaus, na porta do jornal “A crítica”:
Era um sonho dantesco o tombadilho
que das luzernas avermelha o brilho...
Ele me lembra o seu próprio poema “O Cristo do Corcovado”:
“No escalavrado píncaro da serra,
Que o luar alveja e a luz do sol estanha;
E onde a cidade, abençoando a terra,
Se espreguiça na falda da montanha;
Ergue-se o Cristo-Redentor, coitado!
Braços ao ar, o triste olhar cravado
Na base de granito que o suporta
De alma apagada e a consciência morta.
O Cristo cujo busto alvinitente,
Granítico, imponente
E lavado de sol;
Aureolando de alvura o Corcovado,
Qual Prometeu, virado
Para o horizonte, a medir o arrebol;
E, de distância imensurável, visto
Qual uma forma etérea
É apenas um Cristo
Feito à custa de angústias e miséria.”
O poema inteiro está no nosso sítio, em:
http://www.geocities.com/rogelsamuel/cabrinha.html
O verso: “Que a brisa do Brasil beija e balança” tem 4 “bb” de beijos. A bandeira aí ondula aos beijos dos ventos. Nas cores do céu, nas cores da esperança. A bandeira irradia sol. Irradia patriotismo. “Estamos em pleno mar”, o mar azul, o “mar da memória” do amazonense Sebastião Norões:
“Eu quero é o meu mar, o mar azul.
Essa incógnita de anil que se destrança
em ânsias de infinito e me circunda
em grave tom de inquietude langue.
O mar de quando eu era, não agora.
Quando as retinas fixavam tredas
a incompreensível mole líquida e convulsa.
E o pensamento convidava longes,
delimitava imprevisíveis rumos
viagens de herói e de mancebo guapo.
Quando as distâncias fomentavam sonhos.
Rebenta em mim essa aspersão tamanha
que a imagem imatura concebeu
de quando o mar era meu, o mar azul.”
Coube a este amazonense a glória de ter escrito um dos mais belos sonetos do mar. Longe do mar. Só de memória. Norões nasceu no dia 7 de março de 1915, em Humaitá, Rio Madeira e faleceu em Manaus. Estudou em Fortaleza. Aos 18 anos volta para Manaus, faz a Faculdade de Direito. Professor no Colégio Estadual, onde foi meu professor de geografia. Exerceu o cargo de Chefe de Polícia do Estado, quando escondeu e deu fuga ao comunista Jorge Amado. Membro do Clube da Madrugada e da Academia Cearense de Letras. “Poesia Freqüentemente” é livro de minha predileção. Ali sentimos sua poesia viva, sua poesia azul. Nesta pequena obra-prima, que é “Mar da memória”, a ânsia de infinito, como se o poeta quisesse voar, escapar do estreito espaço em que se movia, alcançar Alascas e Austrálias. Revela lembranças, do mar, dos verdes mares de Fortaleza, do mar literário, do mar de Alencar, que era verde. Mas quando “o mar é meu”, o mar de minha memória, é azul, e não verde, de minhas lembranças que se voltam para os céus, dos imprevisíveis rumos de minha vida, sonhada ainda, de imprevisíveis rumos. Pois “arte é o homem acrescentado à natureza”, escreveu Van Gogh, em carta a Théo de 1879. E ele entendia de azul, de delirante azul.
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O CHARME DO PAPEL
Rogel Samuel
Sim, depois de alguns anos vivendo só da Internet, este cronista volta a ter coluna em jornal de papel. No «Correio do Sul». De Minas.
No começo, mantive coluna diária em jornal. Era jovem, tinha energia de escrita, vontade de trabalho. Ainda hoje releio com receio os poucos recortes que restaram, que se salvaram da mudança da amiga que os guardava. Foram defenestrados como lixo, se possível fosse jogar lixo, papel velho, pela janela, como a palavra sugere. Destruídos os recortes, certa vez passei uma semana em consulta aos velhos jornais da época que sobreviveram à traça e tempo.
Naquela época heróica, nós nem passávamos pelo chefe de redação. Íamos diretos ao linotipista. Aquele o tempo do linotipo. Coisa de chumbo. Sempre à noite que vínhamos nós, originais no bolso. Havia gente que escrevia diretamente no linotipo.
O trabalho no jornal entrava noite a dentro. Os ruídos das impressoras eu os ouço até hoje, e o cheiro de tinta ainda me impregnam os sentidos.
Em 1960, cometi tolice exemplar. Por meio do diretor comercial, de nome Senna, sou convidado para ingressar no corpo da redação da TV Rio. Não aceitei. O trabalho era noturno, sem hora para terminar, e eu tinha aula pela manhã na Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, onde me formei em letras. Naquele tempo parece que ali devia trabalhar Walter Clark e o Bôni, ambos da Globo. Eles deviam ter a minha idade. No pouco tempo que ali estive vi gente como Juscelino Kubstchek. Deixei de trabalhar na TV, passei a lecionar no subúrbio. Opção idiota.
O ambiente de jornal era ótimo, naquele tempo. Não só se discutia política, mas literatura. Foi lá que ouvi Hemetério Cabrinha, o poeta, a recitar Castro Alves: «Era um sonho dantesco... o tombadilho». Sim, ele era dramático, principalmente quando entoava o seu «Falando a meu coveiro», um dos seus mais belos poemas:
É aqui neste lugar, ao pé deste cipreste,
junto a este mausoléu. Pega uma enxada, cava
sete palmas de chão! Anda depressa, grava
no teu semblante mudo o riso que escondeste!
Abre o meu leito eterno... O meu lugar é este!
Quero nele abafar minha paixão escrava!
Quero enterrar-me logo... a vida já me agrava...
Depressa! A minha dor de dores se reveste!
Alarga-a mais um pouco, afasta mais a areia!
Ela, assim como está, torna-se muito feia, profunda-a mais... trabalha! Este dinheiro é teu!
Que é isso? Um crânio aí? Dá-mo, quero beijá-lo.
Limpa-lhe bem o pó! Dá cá, quero estudá-lo
Como alguém algum dia há de estudar o meu!
Sim, ele era dramático. Dantesco e shakespeariano. Voz forte, gestualidade grandiosa, tensa, teatralidade assustadora, densa. Olhos ensandecidos de poética.
Aquela era a época das polêmicas. Polemizávamos em versos (!) com o poeta Benjamim Sanches. Assinando Calixto Diniz. Sanches, uma ocasião, respondeu assim: «Cá li isto que você escreveu...» Ele era autor de «Argila» (1953), um livro cor de barro. Certa vez, encontrei a edição quase inteira, esquecida, não vendida, mofando, morrendo num canto do chão de velha e empoeirada livraria. Sanches era melhor contista. Escrevia bem. Não mereceu ficar esquecido. Sua poesia é como em «Transe»:
Em êxtase fitava o céu molhado,
Umedecidos por um cinza brando
E o sangue nas artérias congelado,
As lágrimas no rosto vão rolando.
No espaço um olhar vívido cravado,
O pensamento no ar gesticulando,
Do meu céu ao inferno, condenado,
Eu andei sem saber se estava andando.
Quando saio daquele sobressalto,
Como quem sonha mesmo quando acorda,
Tenho minha alma presa lá no alto,
Vendo o meu corpo nesta lassidão,
Sob o peso das dores que transborda,
Um monstro se arrastando pelo chão.
("Argila", pág. 95, Manaus, 1957).
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Hemetério Cabrinha
Por Ulisses Bittencourt
Chamava-se, na realidade, Hemetério José do Santos, havendo incorporado ao nome o apelido Cabrinha. Espírito de luz, nasceu em Fortaleza, a 3 de março de 1892, tendo desencarnado a 12 de fevereiro de 1959. Veio em 1918 para Manaus, onde cumpriu a sua missão por mais de quatro décadas. Foi operário, na qualidade de marceneiro e, sem freqüentar escolas, acabou transformando-se num intelectual respeitado, num vibrante orador, livros publicados, tudo pela pura força espiritual e capacidade de trabalho. Poeta espontâneo, deixou os seguintes livros: Frontões, Satã, Caim, Meu Sertão, o drama em três atos Regeneração e o mais conhecido, Vereda Iluminada; colaborou em diversas revistas e trabalhos inéditos.
Quando Vargas veio a Manaus em 1940, Hemetério saudou-o com arrebatador improviso em praça pública, o que muito impressionou o então Presidente, acostumado a ouvir grandes tribunos, e este, ao retornar ao Catete, nomeou-o para alto cargo no Ministério do Trabalho, por considerá-lo líder nato do operariado amazonense.
Espiritualista praticante, Hemetério Cabrinha atingiu um vigoroso grau de desenvolvimento espiritual, sempre exercido exclusivamente na direção do bem, no sentido de dar conforto aos angustiados e sofredores. Pela última vez vi-o discursar em março de 1958, numa homenagem, em festa magna, que o Centro de Irradiação Mental do Tattwa Nirvana prestava ao Irmão Agnello Bittencourt.
O carpinteiro era, pela palavra e pelo verso, o Mestre, que dizia, em sua autêntica profissão-de-fé: “A esmola que se dá, sem humilhar quem pede, / É a graça maior que o Grande Deus concede / A quem dores transforma em pétalas de rosas”.
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Frontões, um marco de passagem
Zemaria Pinto
No
quase-vácuo que se forma na literatura amazonense da primeira metade
deste século, três poetas se destacam do marasmo geral, trazendo consigo
a marca da migração que caracterizara a economia destroçada do ciclo da
borracha: o maranhense Maranhão Sobrinho (1879-1915), o piauiense Jonas
da Silva (1880-1947) e o cearense Hemetério Cabrinha (1892-1959). Os
três escolheram viver, produzir e morrer em Manaus. Os
três deixaram marcas profundas numa poesia que só viria encontrar sua
verdadeira identidade a partir da década de 50, com a movimentação
instituída pelo Clube da Madrugada, que sintonizaria a província ao que
de melhor se produzia no resto do país.
A EDUA, Editora da Universidade do Amazonas, marca mais um gol de placa ao dar a lume a segunda edição de Frontões, o último livro de Hemetério Cabrinha, publicado em 1958. Frontões
é um marco de passagem na poesia amazonense, e não por acaso Cabrinha
dedica-o “aos ilustres membros do Clube da Madrugada, na figura
intelectualmente destacada de Farias de Carvalho.” O tempo confirmaria
na obra do então jovem poeta homenageado (Pássaro de Cinza e Cartilha do Bem Amar com Lições do Bem Sofrer) uma afinidade, um quase parentesco inegável com Cabrinha.
Carpinteiro
de ofício, na poesia Cabrinha vai mais além, construindo “frontões que o
coração entre sonhos embuça”, como ele escreve em “Proêmio”, que abre o
volume, fazendo um paralelo entre sua poesia e os adornos
arquitetônicos que dão título ao livro: “Se meus versos não têm o
esplendor de obra-prima, / A pureza da forma e a nobreza da rima... / Se
lhes falta fulgor; / Há neles, entretanto, agudos sentimentos /
Suavizando o clamor dos grandes sofrimentos / Urdidos pela dor.”
Parnasiano
na forma (“Oiro na ganga bruta em rústica bateia”), a profissão de fé é
de um nômade pós-romântico, dilacerado pela incompreensão e injustiça
humanas, como podemos observar nestes fragmentos de “Resignação”: “O
mundo me foi sempre avesso, duro, escasso... / Existem para mim só
aflições extremas... / Em cada anseio meu há uma chaga aberta...” Não
seria nenhuma ousadia afirmar que, além de Olavo Bilac − a quem parodia
com reverência, melhor dizendo, intertextualiza, em “Tortura da Glória” e
“Lendo Bilac” −, o português Antero de Quental (“Só males são reais. Só
dor existe.”) frequentava também a cabeceira de Hemetério Cabrinha. Vem
de Quental, talvez, seu gosto pelos poemas de ideias, reflexões
pessoais que transgridem o conceito de que a imagem é o fundamento da
poesia. Mas se a Quental atormentava e seduzia a dúvida transcendente,
Cabrinha sofria com a crença exacerbada, pois boa parte dos poemas de Frontões
deixa clara sua fé inabalável na doutrina espírita, como podemos
perceber em “Convicção”: “Tenho a certeza de já ter vivido / Através de
outros mundos, outras eras.” E apesar de acreditar que “Entretanto,
através do próprio lodo / Todo o universo se transforma, todo, / E a
própria Eternidade se renova”, sua vida é um calvário só, onde o
sofrimento não tem nome, não é detalhado, mas existe acima de tudo, como
em “Angústia”: “Quanto tenho sofrido ultimamente! / Como este mundo me
tem sido avesso!”
Outro
autor da predileção de Cabrinha é Augusto dos Anjos. Ainda que distante
de alcançar o estro do poeta paraibano, Cabrinha “apropria-se” de seu
vocabulário antilírico em versos inteiros, como em “Monera, larva, lama,
lesma, verme”, “Num óvulo misérrimo e abjeto”, “Da podridão dos úteros
inchados / dos sangrentos refolhos das placentas” ou em expressões como
“embriogenia das moneras” ou “expansão genésica dos sexos”.
Esta
aproximação superficial com Augusto dos Anjos, bem como a possível
proximidade de Antero de Quental, deve levar-nos a refletir sobre o
caráter contraditório da “dor” em Cabrinha. É claro que sua poesia não
melhora nem piora em função de sua “sinceridade”, uma herança romântica
que não acabou com o Romantismo, e, muito pelo contrário, é ainda hoje
uma prática comum, a despeito do caráter intrinsecamente mercantilista
da arte. Em que consiste, afinal, essa contradição em Cabrinha?
O
poema “Por Enquanto, Não” é exemplar: “Disseram que eu morrera. Ainda é
tão cedo / Para deixar em paz o velho mundo, / Onde, por entre espinhos
me enveredo, / Como um simples rafeiro vagabundo. // Bem quisera eu
fugir deste degredo! / Deste terrível lupanar imundo, / Onde, hoje, a
vida é simplesmente o enredo / De um romance de fel e dor fecundo. //
Para que viver mais, quem sobre os ombros, / A cruz da vida tem pesado
tanto, / E trá-la a tropeçar por entre escombros? // Disseram que eu
morrera. No entretanto, / Como um fantasma vil causando assombros /
Ainda arrasto o cadáver por enquanto.” Ora, em que acreditar, no
ceticismo quase cínico deste poema ou em toda a derramada oratória
espírita? Mais, ainda, no poema “Meu Aniversário”, o poeta lamenta “Mais
um ano de dor, mais uma folha lida / No romance real e vil de minha
vida.” A isso se contrapõe uma lírica amorosa romântica que ora se
realiza com toques eróticos (“Idílio” e “Cuidado”, por exemplo) ora
denota frustração, mas sem nenhuma tendência suicida, como no belo
“Encontro”, que narra um des/encontro na idade madura, e que, pelo seu
equilíbrio, merece ser destacado entre composições que beiram a
pieguice.
Parnasiano, místico, romântico, epígono de Bilac, Quental e Augusto dos Anjos, embora isso tudo seja contraditório, Frontões
mostra-nos um autor que tem pressa de viver e de mostrar sua produção.
Assim, completa sua obra com poemas de cunho social-romântico
(“Preto-Velho” e “Itatiaia”), poemas de inspiração parnaso-regionalista
(“O Amazonas”, “Canção do Amazônida”, “Boiúna” e “A Pororoca”) e os
longos poemas narrativos, já publicados anteriormente, “Satan”, “Caim” e
“Cristo do Corcovado”. Como curiosidade, a duas fábulas interessantes,
“A Aranha” e “O Grilo”, vêm juntar-se ao que hoje classificaríamos como
poesia de autoajuda: “Canção da Dor”, “A Caridade”, “Conselho”,
“Filosofando” e o execrável “Parêmias”. Bobagens, filosofices.
Seria
inútil, até porque não é isso o que se espera da poesia, tentar
entender a personalidade de Cabrinha a partir dos poemas de Frontões.
Mas sua autocomiseração alia-se a uma consciente marginalização, uma
autoexclusão do mundo que o cerca, desde a dedicatória, no fundo
bem-humorada: “Aos que me repudiam; aos que me odeiam; aos meus
inimigos, esses que me ensinaram a perdoar e esquecer ofensas: esta
página incolor.” Não é muito provável que Cabrinha conhecesse aquele
samba de Noel, gravado em 1933 por Mário Reis: “O mundo me condena / E
ninguém tem pena / Falando sempre mal do meu nome (...)” A aura marginal
do poeta de Vila Isabel decorria do enfrentamento ao seu meio social. E
quanto a Cabrinha, qual a motivação de sua arenga com o mundo? Não
seria isso apenas um sintoma de seu romantismo?
E
aqui me refiro ao romantismo enquanto vertigem, e a esta enquanto
sensação de ter o mundo girando a nossa volta, ou, inversamente, de que
giramos descontroladamente no centro do mundo. A vertigem é a recusa às
regras, aos modelos, às normas − é o grito pela liberdade de criação. A
vertigem não comporta a arte vestida de linho branco sob a brisa de uma
tarde azul de domingo. Não, a vertigem é o caos, a anarquia, a aventura,
o desequilíbrio, a lama, a podridão, a escuridão. A vertigem é o não.
Mago,
profeta, predestinado, o gênio romântico sob a vertigem tem êxtases
místicos, que lhe descortinam o suprarreal e o infinito. A beleza
torna-se relativa e seus ingredientes passam a ser antagônicos. As
inquietações populares, ele as busca enquanto elas ainda adormecem no
seio do povo. O romântico é um revolucionário. Sua pátria é o mundo. E
ele parte em busca de outros mundos, procurando a essência, o primitivo,
o primordial.
Mas
esses dois parágrafos aí em cima coadunam-se mais com o gênio romântico
de um Antonin Artaud ou de um Glauber Rocha do que com o nosso estimado
Hemetério Cabrinha, que não conseguiu romper a carapaça parnasiana, e,
longe de ser moderno, não foi autenticamente romântico. Para usar uma
imagem arquitetônica, tão ao seu gosto, Cabrinha foi ponte, foi
passagem. Sua importância histórica é bem maior que a discussão sobre a
in/sinceridade de seu autodilaceramento. Seus bons poemas ficarão como
candeias na noite tenebrosa de uma literatura que procura se afirmar
para além do convencional, além do óbvio. Cabrinha retornou ao nosso
convívio, e é ele mesmo. E isso é muito bom.
(Publicado no segundo semestre de 1997, no Amazonas em tempo.)
O Poeta Espírita Hemetério Cabrinha
A História do Espiritismo em Manaus é repleta de personalidades de influências e atuações espíritas marcantes nas mais variadas épocas. A mais de um século o Movimento espírita atua nas sendas amazônicas, instaurando transformações oportunas e necessárias à sociedade manauense. Neste ínterim de forças espíritas atuantes, temos na personalidade do poeta Hemetério Cabrinha, uma louvável atuação artística e social.
O verdadeiro nome do poeta é Hemetério José dos Santos, nascido em 1892 em Fortaleza (Ceará), e levado a óbito em 1969 em Manaus, terra que escolheu para viver e dar seguimento a sua vida poética e inspiradora de valores espirituais. O pseudônimo Hemetério Cabrinha é originário de um apelido de infância, nome artístico que preservou ao longo de sua existência.
A vinda de Hemetério Cabrinha para Manaus, deu-se em 1916. Este, como tantos outros nordestinos que para cá vieram, traziam a esperança de encontrar oportunidades na Manaus esplendorosa da borracha. Porém, vivenciou apenas os últimos dias de tal fulgor. Migrante nordestino, viveu do trabalho honesto de sua profissão em carpintaria, recebendo a acolhida gentil da exuberante selva amazônica. Seu talento nato para a poesia e sua postura honesta e comprometida com as causas espíritas, o tornam um dos grandes representantes da poesia espírita de meados do século XX em Manaus. Sua atuação social é notável através da oratória vibrante em defesa dos mais humildes, aparecendo em campanhas cívicas na cidade de Manaus, onde a sua poesia o torna arauto nas reivindicações pelas melhorias sociais urbana.
O amor a poesia o levou a fundar um grêmio literário denominado Academia dos Novos, passo vitorioso para mais tarde influenciar na formação do Clube da Madrugada, em 1954, o qual se tornaria famoso como ponto de convergência da intelectualidade literária de então. Neste Clube, que Hermetério participou ativamente, sua poesia tinha grande reconhecimento e também trânsito para se fazer reconhecida em outros estados.
Em sua trajetória como poeta do Espiritismo em Manaus, encontramo-lo integrando ativamente o Movimento Espírita da época e com atuação nas sendas do bem vai além da poética. Hemetério Cabrinha, em conjunto com outros espíritas da época, frente ao comprometimento com a causa, participou da fundação, em 1° de janeiro de 1951, do Centro Espírita Tenda de Jesus. Que inicialmente funcionou nas dependências da casa de Hemetério Cabrinha, na Rua Mundurucus, nº 108 – Centro que também abrigava a Escola de Estudos Espíritas Kardequianos, reunindo numeroso grupo de estudiosos, em reuniões científicas e doutrinárias.
Atualmente conhecido como Centro espírita Morada de Jesus, esta casa de consolo na seara do bem só conseguiu ter a sua sede própria em 25 de dezembro de 1971, situando-se na Rua Leonor Telles, 120, Bairro do Aleixo (antiga Rua Javari, entre as ruas Paraíba e Belo Horizonte, na divisa dos bairros de Adrianópolis e Aleixo) onde funciona até os nossos dias. Por longos anos, o Centro Espírita Tenda de Jesus foi dirigido pelo poeta Hemetério Cabrinha, que foi sucedido mais tarde por Otília Adalta da Costa até o desencarne desta em 1983.
A atuação valorosa de Hemetério Cabrinha ao longo de sua existência como poeta e espírita, demarca um legado literário de força e técnica, que nos leva a reconhecer que este homem de bem, cujo ofício de carpinteiro exercia de forma primorosa, era também um esteta da palavra. Foi um grande conhecedor das obras imortais de Olavo Bilac, Antero de Quental, Augusto dos Anjos, ente outros grandes da literatura brasileira, dos quais é possível perceber a influência em suas poesias. Além de estudar e conhecer a fundo os ensinamentos da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, estudou obras poéticas espíritas, como Parnaso de Além-Túmulo, psicografado por Francisco Cândido Xavier em 1932.
Este líder nato presenteia a posteridade com obras poéticas repletas de ensinamentos iluminativos e requintes literários. Em seus poemas se percebe a linguagem técnicas das influências literárias conhecidas ao longo de sua existência, como o romantismo, o parnasianismo, e o simbolismo. Característica comum aos poetas de sua época, este ecletismo poético, surgem nos poemas de Cabrinha, permeados dos ideais e conhecimentos espíritas.
O inconformismo de alguns poemas, a lírica amorosa de outros, ou mesmo o regionalismo também encontrado nos versos deste poeta, são autenticidades existenciais deste seareiro da grande floresta amazônica. No entanto, grande parte de seus escritos ganham vida na fé inabalável no Espiritismo e nos ensinos de Jesus. Hemetério Cabrinha configura-se como um homem de bem e, em toda sua vida, portou-se como verdadeiro espírita, com comprometimento e amor a causa. É um espírita nos moldes que o codificador nos aponta:
Reconhece-se o verdadeiro espírita por sua formação moral, e pelos esforços que faz para dominar suas más inclinações. (Allan Kardec, E.S.E., XVII, 4).
Seu último livro, Frontões, foi publicado em 1958, caracterizando-se como uma das melhores obras Cabrinha. A este livro o poeta agregou publicações anteriores, dando assim características de um certo hibridismo poético. Pela importância reconhecida de sua obra poética, Hemetério Cabrinha teve relançada a segunda edição de Frontões pela EDUA (Editora da Universidade do Amazonas) em 1997.
Além dessa, foram publicadas de sua autoria as seguintes obras: O meu sertão (Manaus: Palais Royal, 1920), Satã (Manaus: Palais Royal, 1922), Vereda iluminada. Manaus: Imprensa Pública, 1923), Caim (Manaus, s. n., 1934), Frontões. (Manaus: Sérgio Cardoso, 1958).
– A presença de ensinamentos espíritas em suas poesias:
A seguir serão apresentadas duas poesias de sua lavra para servir como base indicativa do conteúdo espírita que as mesmas portavam, sem comprometimento da universalidade da linguagem, da beleza das imagens criadas, e da técnica construtiva.
Na primeira (Quem fui e o que serei) pode ser encontrada a tese espírita para processo evolutivo dos seres inteligentes que povoam o universo. Nesta, o principio inteligente criado por Deus, inicia sua trajetória em busca de automatismos biológicos pelos reinos inferiores da natureza e, depois de completada suas aquisições nesse aspecto, é transformado em Espírito, simples e ignorante, mas já dotado de consciência de si, razão, juízo de valor e outros atributos da racionalidade. A partir desse ponto ele inicia sua evolução em busca de conhecimentos e virtudes até transformar-se em Espírito Puro.
Na segunda (Hora Extrema) pode ser encontrada a tese espírita para a existência e imortalidade do espírito. Nesta, os espíritos são compreendidos como individualidades inteligentes da Criação Divina e destinados a perfeição. As diferenças existentes entre eles não constituem espécie distinta, mas diversos graus de adiantamento moral e intelectual. Eles são as almas dos homens encarnados. O mundo corporal e o mundo espiritual agem incessantemente um sobre o outro; pela morte do corpo, o mundo corporal restitui o espírito à sua pátria de origem, e pela reencarnação o mundo espiritual constitui a humanidade
QUEM FUI E O QUE SEREI (Frontões)
Fui húmus, fui cristal, fui pedra bruta,
E nas substâncias da matéria inerme,
Vim desde a vibração ao paquiderme,
Após milhões de séculos de luta.
Monera, larva, lama, lesma, verme
Fui, (para a expansão da causa Absoluta
De onde a vida nos corpos se transmuta)
Até sentir calor na minha derme.
Na transcendente hereditariedade,
A minha rude personalidade
Chego a ser o que é na vida hodierna…
E daqui para além irei seguindo,
Evoluindo sempre, evoluindo
Até chegar à Perfeição Eterna.
HORA EXTREMA(Frontões)
Na hora extrema, quando o frio corta
Os neurônios nas dores aguçadas
E a alma, dentro da carne, não suporta
A atrofia das células cansadas.
Das articulações paralisadas,
Rompendo o véu da natureza morta;
Na leveza das formas irisadas
À verdadeira vida se transporta
E, liberta das dores, dos cansaços,
Na plenitude excelsa dos espaços,
Fora das exigências da matéria;
Em proporção que do orbe se desata,
Sente que a vida plena se dilata,
Em sua própria natureza etérea.
-Evidentemente, a obra literária de Hemetério Cabrinha é um marco na história da literatura espírita amazonense. Os aspectos relacionados à sua vida literária, os fatos relacionados à sua atuação na seara espírita, o reconhecimento de sua obra poética pelas instituições de ensino superior e literatos amazonenses, comprovam a valorosa participação intelectual e espiritual deste migrante nordestino, que adotou o Amazonas como sua terra de coração e oração.
O Movimento Espírita amazonense ao longo de seus cento e quatro anos tem no exemplo de vida deste lúcido poeta, o exemplo de espírita comprometido com a causa. Mesmo as dificuldades da época por ele vivida, especialmente os preconceitos enfrentados pelo próprio Espiritismo e aqueles motivados por evidenciar em seus poemas a sua fé, não enfraqueceram os objetivos de seus ideais espirituais.
A poesia de Hemetério Cabrinha é literatura que nos doa horizontes dentro das perspectivas de transformações da espiritualização da arte amazonense. Pelo exemplo vivido, este nobre poeta fora discípulo fiel dos ideais espíritas. De onde podemos afirmar que o estudo sobre sua obra literária e atuação doutrinária nos inspira a continuar a obra de iluminação cristã nas searas amazônicas.
Iva Tai
EM TORNO DE HEMETERIO CABRINHA
Semana passada, postei um artigo do padre Walter Nogueira que bronqueava com o contista Arthur Engrácio, em disputa que envolvia o saudoso poeta Hemeterio Cabrinha. Abaixo vai o direito de resposta do acusado, publicada (interessante) no mesmo jornal A Crítica, do dia imediato, 18 de julho de 1958.
A Crítica, 18 de julho de 1958 |
O PADRE Walter BRAZ GONÇALVES Nogueira é desses tipos que, a exemplo dos símios enraivecidos (que mordem a cauda quando nada encontram para morder), brigaria com a própria sombra se não achasse com quem pudesse derramar a sua fermentada bílis. Pequenino, ar humilde, ninguém supõe o de que é capaz esse campeão da sapiência no campo da insídia e da futrica. Pode passar sem um bom perfume para borrifar a sua bata elegante, mas o que não poderá passar é sem uma pendência, uma querela, uma lengalenga qualquer.
Vai daí ter ele, ontem, no seu espernegado neste jornal, se saído com quatro pedras na mão contra o pobre signatário destas linhas pelo simples fato de havermos publicado um artigo LITERÁRIO no qual comentamos, ligeiramente, o livro do poeta Hemetério Cabrinha, intitulado "Frontões". Doeu-se o minúsculo Guliver com umas referências que ali fizemos à sua castíssima pessoa e, doendo-se, escoiceou, esbravejou, puxou faca, numa demonstração clara de que é mesmo afeito a barulho.
* * *
MAS se o padre Walter BRAZ GONÇALVES Nogueira gosta de uma brigazinha, nem sempre escolhe uma arma adequada, limpa, honesta, digamos assim, com que enfrente o adversário. Se é desleal na vida comum, nos entreveros que provoca, para se safar, essa deslealdade, então, assume proporções avantajadas. É bem o que se poderia chamar de um Maquiavel-mirim de saias. Note o leitor que nos teve sob a vista que não fizemos a mínima alusão à Igreja. Falamos, isto sim, de "certos espíritos medíocres”; de um “jornaleco rotulado de católico, propugnador da verdade..."; de um “frutriqueiro das esquinas" etc., palavras essas cuja veracidade provaremos mais adiante, e as quais nada têm a ver com a sublime Instituição de Cristo, pelo menos no entender dos coerentes, dos sensatos.
Todavia, se a Coerência e o Bom Senso assim preceituam, já o professorzinho de Grego do Colégio Estadual pretende que, com aquelas nossas frases, tenhamos atacado a Igreja, o que, sobre ser uma saída pouco decente e viril, é uma forma sórdida, de atirar-nos à odiosidade dos católicos, o que não conseguirá, felizmente.
Sem argumentos honestos para debater assuntos honestos e à semelhança do garoto safado que, para livrar-se dos safanões de um adversário, corre a proteger-se na saia da mãe, o reverendozinho, temendo o nosso revide, trata de ocultar-se sob o nome da Santa Igreja. Mas é assim. Essa gente faz o diabo, pinta os canecos, prevarica à vontade, e, chamada a prestar conta dos seus atos, é o nome da Igreja que logo invoca.
MAS vamos deixar a Igreja de lado, que nada tem a ver com as futricas gonçalvinas desse Torquemada de araque, "doublé" de jornalista e professor de Grego. Trataremos diretamente de alguns tópicos do seu arrazoado, provando, inclusive, o que linhas atrás prometêramos fazê-lo. A dois pontos apenas nos reportaremos: 1° PONTO: — Nega-se o padre Walter BRAZ GONÇALVES Nogueira a acoitar o título de "espírito medíocre" que lhe demos. Agora perguntamos: não é espírito medíocre quem, não entendendo de um assunto se mete a falar do mesmo? Ilustremos o caso. O padre Walter BRAZ GONÇALVES Nogueira, pelo fato de ser católico, tratou de arrasar, de pulverizar o livro do poeta Hemetério Cabrinha por este professar o espiritismo, simplesmente. Isto, sem se dar ao trabalho de ler a obra, analisá-la literariamente como seria o justo e o correto. Um espírito superior, padre Walter, que não fosse medíocre jamais teria esse gesto. E você o teve.
2° PONTO: Pisou na brasa o padre Walter BRAZ GONÇALVES Nogueira por o havermos chamado de "frutiqueiro das esquinas". Ora, o Pai-dos-Burros, entre outras definições, diz: FUTRICAR – "intrometer-se (em alguma coisa para atrapalhar)". Logo, futriqueiro... é quem, não sendo nem literato nem crítico literário, mas apenas movido por paixões religiosas, se intromete na vida de um consagrado poeta com o fim exclusivo de atrapalhá-lo. Querem uma prova? Tome-se o número de o "Universal" do dia 25 de maio, e na coluna "Conversa de Esquina" vamos surpreender dois futriqueiros em animado bate-papo. Falam do livro "Frontões", de Hemetério Cabrinha, e à certa altura, um dos interlocutores, interpelado pelo outro, responde: – "A pura verdade. Não lhe aconselho a comprar o livro (Frontões), pois não vale a metade do preço que pedem. Refiro-me ao conteúdo, está claro...".
Um jornal sério, zeloso sacerdote de Cristo, que se prezasse; que cumprisse realmente a finalidade de "orientador católico", jamais estamparia em suas páginas escrito, de tal ordem; jamais manteria a torpe campanha de infâmia e de descrédito contra um pobre escritor que, enfermo além do mais, é do produto do seu labor que se mantém. Onde está a orientação católica desse jornal? Ele orienta ou desorienta os católicos? Faz ou não faz.
Responda a essas perguntas, se puder, o ingênuo BRAZ GONÇALVES das futricas.
_________________________
P.S. – Quanto às suas ameaças, não nos infundem o menor temor. Não somos contra a Igreja, repetimos. Somos, sim, contra os seus falsos apóstolos, os seus adeptos mascarados. E quando vier, venha com jeito, pois que já pegamos muito bicho bom pelo pé, e não nos custara agarrar mais uma gralha e depená-la toda.
Hemetério Cabrinha
Imigrante nordestino
Hemetério José dos Santos nasceu em Fortaleza, em 1892. Faleceu em Manaus, em 1959. Veio para Manaus em 1916, aos vinte e quatro anos, possivelmente atraído pelo alarde que se fazia da Amazônia lá fora. Participou ativamente da vida cultural da cidade, chegando a fundar um grêmio literário: Academia dos Novos, com preocupações modernistas.
Poeta e carpinteiro
Profissionalmente, Hemetério dedicava-se à carpintaria. Mas era na poesia que buscava a realização do seu "eu" e extravasava a sensibilidade e as angústias que habitavam o seu ser.
Primeira obra
Estreou na Literatura Brasileira em 1920, com o livro de poemas O Meu Sertão.
Todas as obras
O Meu Sertão (poesia, 1920)
Satã (poesia, 1922)
Vereda Iluminada (poesia, 1932)
Caim (poesia, 1934)
Cristo do Corcovado (poesia, 1952)
Frontões (poesia, 1958)
Contexto histórico
Na História do Amazonas, o Ciclo da Borracha vai das duas últimas décadas do século XIX até as duas primeiras décadas do século XX. São mais ou menos 40 anos de transformações violentas para o Estado do Amazonas. Eis alguns dados importantes deste período histórico:
- Entre 1858 e 1862, o Amazonas exportou um total de 997 toneladas de borracha.
- Somente em 1919, três anos após a chegada de Hemetério Cabrinha a Manaus, o Amazonas exportou um total de 44.000 toneladas de borracha.
- O período fausto, de riqueza fácil e de consumo desenfreado, durou apenas quatro anos. Manaus ganhou aparência de capital européia.
- Manaus entrou em decadência, voltando à condição de província.
O poeta foi testemunha do pesadelo em que se transformou o Amazonas após o brilho falso do apogeu da borracha.
Os melhores poemas
reunidos em um livro
Hemetério estava com sessenta e seis anos quando publicou Frontões, sua última obra. A intenção clara do poeta era enfeixar em um livro os poemas mais representativos do seu labor poético. Aos poemas novos, juntou mais três de obras anteriores: Satã, Caim e O Cristo do Corcovado.
Voçoroca na Aparecida ameaça história
Solo desgastado pelo igarapé de São Raimundo pode fazer casas construídas em 1930 ruirem.
Manaus, 07 de Fevereiro de 2011
MONICA PRESTES
Conjunto de casas de arquitetura semelhante ficam localizadas em uma das áreas mais antigas do bairro de Aparecida
Um conjunto arquitetônico de casas construídas na década de 1930 - onde já viveram e trabalharam ícones como o artista Hemetério Cabrinha e o cantor Estevão Santos - e que são parte da história de uma das áreas mais antigas do bairro da Aparecida, um dos primeiros da Zona Sul de Manaus, está ameaçado de desaparecer por conta de desbarrancamentos no igarapé de São Raimundo, fenômeno conhecido como “voçoroca”, que já compromete a estrutura de todos os imóveis.
Parte das casas ainda guarda características e detalhes da época em que foram construídas, como pisos de madeira acapu e pau-amarelo, - conhecido como madeira preta e branca, semelhantes aos pisos do Ideal Clube e do Palácio Rio Negro - corrimãos em madeira maciça e tetos com acabamento em madeira, feitos pelo renomado artista Hemetério Cabrinha.
Algumas casas conservam, até mesmo, as mesmas fachadas que, na maioria dos casos, estão escondidas pelos sinais do tempo e pedem por um restauro.
“As casas datam da década de 1930 e foram construídas para os altos funcionários das fábricas de cerveja e de gelo dos Miranda Corrêa. Eram as mais bonitas do bairro, naquele tempo. Além das personalidades que viveram lá, detalhes do teto e das escadarias foram feitos pelo Hemetério Cabrinha, grande carpinteiro, poeta e escritor, que deixou nesses imóveis verdadeiras obras de arte. Pela história que guardam, aquelas casas devem ser preservadas”, declarou o pintor e artista plástico renomado Moacir Andrade, 84, todos eles vividos no bairro da Aparecida, onde fez sua história.
Dois desses imóveis já foram abandonados pelos últimos moradores, que temiam por um desmoronamento, provocado pela força das águas do igarapé, tragédia que já se anuncia desde o início do período de chuvas, no fim do ano passado.
Um dos pilares de sustentação das casas já foi parcialmente destruído e está ‘pendurado’. Abaixo dele e do restante das casas, há um barranco de mais de dez metros até o nível atual do igarapé.
Moradores
O alerta sobre o risco de desabamento das casas e da área de terra foi feito por um dos moradores do conjunto, o professor de artes marciais Alessandro Vasconcelos, 39. Ele contou que as duas casas desocupadas pelos vizinhos dele já apresentam rachaduras e tem a estrutura comprometida.
O alerta sobre o risco de desabamento das casas e da área de terra foi feito por um dos moradores do conjunto, o professor de artes marciais Alessandro Vasconcelos, 39. Ele contou que as duas casas desocupadas pelos vizinhos dele já apresentam rachaduras e tem a estrutura comprometida.
“Nasci e cresci aqui nessa casa e posso dizer que, ao longo dos anos, o curso do igarapé vem mudando aos poucos, depois da construção da ponte. Como não foi feita nenhuma obra de contenção para proteger nossas casas, a água está ‘cavando’ o barranco debaixo das casas, que já começou a ceder”, disse ele.
Ainda segundo Alessandro, a primeira das 11 casas já foi condenada pela Defesa Civil no fim do ano passado e pode desabar a qualquer momento. A edificação já está esvaziada.
“A nossa preocupação é com um efeito dominó. Se a primeira casa cair, ela pode levar as casas vizinhas junto. Mais do que nossas casas, é um pedaço da história do bairro da Aparecida e de Manaus que pode ir por água abaixo, literalmente”, analisou o professor de artes marciais que espera sensibilizar o poder público.
Voçoroca na Aparecida ameaça história
Solo desgastado pelo igarapé de São Raimundo pode fazer casas construídas em 1930 ruirem.
Manaus, 07 de Fevereiro de 2011
Hemetério Cabrinha realmente teve uma trajetória fascinante: foi escritor, carpinteiro, espírita e militante das causas sociais.
ResponderExcluirRecentemente escrevi um artiguinho sobre ele e outros migrantes nordestinos. Caso alguém se interesse: https://www.academia.edu/resource/work/73833782