sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

AGNELLO BITTENCOURT: REMINISCÊNCIA DO AYAPUÁ





AGNELLO BITTENCOURT

REMINISCÊNCIA DO AYAPUÁ

(Foto da CASA GRANDE em 1928 com os netos de Lourenço Mello e ao fundo a âncora do navio Carolina. Carlos Araujo Lima, famoso jurista, aparece na foto, adolescente).




Rio de Janeiro

1966


CAPÍTULO III - A CONQUISTA E O PIONEIRO



Ninguem sabe quem foi o primeiro homem civilizado que visitou o lago do Aiapua. É bem possivel que o pernambucano Serafim Salgado e o mulato Manoel Urbano da Encarnagao nele penetrassem pelo meado do seculo XIX, quando subiram o Purus, em viagem de exploragao.

Consta a tradigao que Fleury da Silva Brabo, Caripuna Maues e o Capitao Thury, todos negociantes, estiveram nesse lago, procurando conhecer suas riquezas naturais. Mas lá nao permaneceram.

O Aiapuá recebeu, em 1850, a visita do Capitao Manoel Nicolau de Mello, natural de Pernambuco. Era, tambem, negociante, senhor de alguns escravos e casado com uma cabocla do Rio Negro, onde passara algum tempo, logo que viera de sua terra. Além dos servos, possuia credito na Capital da sua Provincia. Dizia pertencer a velha e reputada familia Bandeira de Mello.

Nao sei em que lugar do Rio Negro teria vivido Manoel Nicolau de Mello. Fui apenas informado que, ao chegar ao Aiapuá, entrara em contacto com os indios muras, dos quais gostara, certificando-se das vantagens que poderia auferir dos vastos castanhais e seringais daquelas florestas, como da abândancia de pirarucus daquelas aguas.

Resolvera ali fiGar, fixando sua tenda de trabalho e mandando buscar, da terra de sua mulher, fregueses e famulos.

Manoel Nicolau era mulato, de porte desenvolvido e de cultura intelectual variada, principalmente em medicina, 0 que pude inferir a vista de muitas notas e registros em um caderno que encontrei, em 1900, em uma estante de livros que the pertenceram e que, mais tarde, passaram ao seu filho Lourengo, de quem falarei adiante. Esses livros revelaram-me tambem a preferencia dessa cultura e seu gosto pela literatura classica. Entre outras obras que observei, lembro-me das seguintes: "Arquivo Pitoresco" (11 volumes), "Palmeirim de Inglaterra", obras de Victor Hugo e de Voltaire, os "Lusiadas", de Camoes, "Gil Blas de Santillane", de Lesage, 'Sermoes", de Montalverne (4 volumes), 0 "Piolho Viajante" (5 pequenos volumes), tratados de medicina etc.


Informaram-me que o pioneiro da civilizagao em Aiapuá repartia suas atividades entre os livros e os negócios.

A salga do pirarucu era, na epoca, o preduto mais vantajoso. A esse comercio se dedicara nos primeiros anos 49 seu estabelecimento, estendendo-o, conjuntamente, a extraçao da castanha para o que carecia de maior numero de braços trabalhadores. Fez publicar no jornal "Estrela do Amazonas", de Manaus, em 1856, um anuncio convidando quem quisesse se localizar em Aiapuá para se dedicar a agricultura e a colheita da castanha. Teria, para isso, passagens e auxilio economico.

Vi esse anuncio em um dos numeros daquele periódico apenso aos autos de legitimaçao de terras do lote "Perseveranga", do mesmo lago, lote legitimado anos depois pelo filho Lourengo Nicolau de Mello . Está no Arquivo Publico de Manaus. Contaram-me alguns contemporaneos de Manoel Nicolau que muita gente atendeu aquele convite e, realmente, se fixou nas terras marginais do lago.

Os indios muras, que viviam errantes, arrancharam-se em duas malocas: uma situada na enseada do Maues e a outra no igarape do Bacuri.

Por volta de 1889, o povoamento havia aumentado consideravelmente. 0 Governo provincial criou, em Aiapuá, uma subdelegacia de policia e uma Inspetoria de índios, nomeando para ambas aquele pioneiro. Criara tambem uma escola elementar que foi provida pelo professor Raymundo Nonato de Souza, escola de vida precaria, por ter, logo depois de instalada, adoecido e falecido o servidor. Essa escola ficou fechada por alguns anos.

Em 1889, Manoel Nicolau teve necessidade de ir a Lisboa para efetuar uma extração de catarata. Seguiu e foi feliz no tratamento. Regressando ao lago, pouco subsistiu, pois faleceu em 1890. Foi sua morte um grande abalo para os filhos que se estavam educando no Para e para os seus fregueses, que defendia com tanto ardor.

A esse tempo, a ilha do Cemiterio era um povoado, contendo nada menos de 15 casas, sendo a sede da vida local. Em 1896, quando fui, pela primeira vez ao Aiapuá, passar meu periodo de ferias, algumas dessas casas ja se encontravam vasias. Comegara a decadencia desse povoado, apesar de sua magnifica situação, da qual se descortina um lindo panorama.

Com o desaparecimento do chefe, tudo sofreu. 0 barco denominado "Carolina", que fazia viagem de Recife a Manaus e, dai, ao Aiapuá, de propriedade de Manoel Nicolau, paralisou e, velho e imprestavel, foi ao pego, em frente ao povoado da ilha do Cemiterio. Quis duvidar da existencia desse barco, mas diversas testemurihas de suas viagens, no oceano, a vela, e no Solimoes e Purus, a sirga e varejao, afirmaram-me o aparecimento do casco revestido de folhas de cobre, ao auge das grandes vazantes do lago. Comprova-o, ainda, ate agora, uma grande âncora de cinco garras retirada do local do afundamento e colocada sob um pedestal de cimento, ao meio do jardim da casa, hoje em ruinas; dos herdeiros do Coronel Lourengo Nicolau de Mello (falecido em 15 de setembro de 1905), o verdadeiro continuador da obra de seu pai, quer no comercio, quer nas relagoes sociais. A história de uma localidade gira, as vezes, em torno de um homem e de um dos seus descendentes. É o caso do Aiapua, em relação a Manoel Nicolau de Mello e de seu filho Lourengo, que foi, por circunstancias economicas, obrigado, a abandonar seus estudos, em Belem, a fim de assumir a responsabilidade da casa comercial de seu progenitor.


Manoel Nicolau deixou varios filhos; conheci os seguintes: Lourengo, Nuno, Leopoldino, Isabel, Benvinda, Raimunda, Mirandolina e Tereza, que ainda vive em Belem.


A nova sede da vida comercial de Aiapuá deslocou-se da ponta da ilha do Cemiterio para a foz, do igarape Santo, Antonio, na parte ocidental do lago. Foi aí que Lourengo Mello, após haver contraido nupcias com Felicidade Augusta Robert, filha do comerciante frances Sebastian Robert e de Felicia Barroso Robert (amazonense), construiu o seu barracao de neg6cio e de residencia.

Nesse local, ja existia um "sitio", ou melhor, uma casa de moradia do Italiano Ventillari, cuja posse Lourengo Mello comprou, procedendo, mais tarde à respectiva demarcagao e legalizagao a que atras aludi. Foi o agrimensor Silverio Jose Nery que fez a demarcação desse lote, embora seja outro, o Italiano Capriti, nome ostensivo do demarcador. Um grande campo de criagao bovina e cavalar aí foi aberto e apascentadas mais de 60 cabeças. Vi-o, de 1896 ate 1905, época da morte do seu proprietario, quando o rebanho, quase ao abandono, foi diminuindo, até extinguir-se.

Lourengo Mello era homem progressista e estimava o conforto. Não satisfeito com o seu barracão 'Santo Antonio", todo de palha e chão batido, mandou buscar em Manaus pedreiros e carpinteiros, fazendo construir, um pouco alem daquele barracão um vasto prédio, que o povo do lago passou a denominar Casa Grande.

Era, realmente, o maior e mais confortavel prédio de todo o baixo Purus, exclusivo para a residencia da familia, enquanto a Gerencia e a Loja continuavam no "Santo Antonio", que, pouco mais tarde, foi substituido por outro barracao todo de madeira, e coberto de telhas de barra, ainda hoje existente, mas em estado de ruinas.

Ate certo ponto, é verídico o brocardo: "Quando morre o dono, a casa cai". Falecido Lourengo Mello em 1905, a firma comercial de Aiapuá passou para a direção do Dr. Adelino Cabral da Costa, um dos genros daquele saudoso negociante. Adelino, que veio a falecer em 1937, nao obstante sua fulgurante inteligencia e sua bela cultura, nao tinha vocaçao para o comercio. As transagoes nao eram fiscalizadas. Nunca havia saldos positivos. Sempre o regime de "deficit", apesar dos progressivos preços da castanha e do pirarucu salgado, nas praças de Manaus e de Belem, para onde se enviavam os produtos das colheitas. A afamada castanha do Aiapuá, que se recomendava por sua limpeza, alcançando, por isso, as melhores vendas naquelas praças (Manaus e Belem), foi sendo relegada a um segundo plano. Os "regatoes" começaram a imiscuir-se na freguesia da casa. A l.a Grande Guerra, que quase paralisou a exportação da preciosa amendoa, concorreu para a "debacle". Comia-se muito mais do que se produzia.



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CAPÍTULO IV DESCENDÊNCIA DE MANOEL NICOLAU DE MELLO

LOURENÇO NICOLAU DE MELLO

Trata-se da figura principal da localidade, não só pela sua cultura, como pela sua ação. Filho do fundador da gleba, tinha o tipo do caboclo. Herdara, certamente, a compleição e os traços de sua mãe. Robusto, inteligência viva, fora mandado estudar preparatórios em Belém (Pará) com seu irmão Leopoldino. Internado no colégio do Padre Rocha, fez-se, desde logo, um dos primeiros alunos.


Lourenço contou-me que se conformara com todos os "trotes" dos colegas, menos com aqueles que feriam sua dignidade. Por vezes, teve de repelir as afrontas ou humilhações, estabelecendo reboliços que reclamaram a intervenção do Diretor. Uma delas, referiu-me, foi a seguinte: um grupo de estudantes dos mais alentados entendeu de amofiná-Io constantemente, imitando, com o braço direito, o gesto do pescador quando arpoa o pirarucu. Era mais uma ofensa que não devia ser suportada, assim o entendeu o caboclo do Amazonas, expressão com que o chasqueavam sempre. Uma explosão de raiva determinou que o provocado descalçasse um dos seus sapatos e, com ele, investisse no mais irritante do grupo. Lourenço virara uma fera, pondo o colégio em polvorosa. 0 estrago não foi pequeno. Por um pouco, Lourenço não é despedido, tendo-Ihe valido seu comportamento e aplicação aos estudos. Nunca mais o quiseram ridicularizar.


No colégio ficara por três anos, aproximadamente. Seus preparatórios (curso de humanidades) estavam quase a concluir, quando lhe falece o pai. Foi um transtorno. Teve de recolher-se, com seu irmão Leopoldino, ao Aiapua e começar a labuta comercial, assumindo, na sua responsabiIidade de adolescente, a manutenção e educação de seus irmãos menores, como de alguns sobrinhos órfãos. Fundou o barracão Santo Antonio a foz do igarapé deste nome, na parte mais ocidental do lago. D. Felicidade Augusta Robert de Mello, sua esposa, ajudou-o tenazmente, lidando com a freguesia, na safra da castanha e da borracha, como ainda na assistência do transporte de lenha (combustível) para os gaiolas, no porto de Novo Trombetas (no Purus). Lourenço Mello disse-me algumas vezes que foi esse o período mais
duro de sua vida. Mas, em compensação, o de maior prosperidade, pela segurança e alargamento dos seus negócios nas plagas de Manaus e Belém, para onde enviava os produtos de suas safras.


Na capital, entre seus amigos de infância, se achava meu saudoso pai, o Coronel Antonio Clemente Ribeiro Bittencourt, em cuja casa se hospedava, sempre que vinha a cidade ou em trânsito para o Pará. Eram dois amigos, como raros tenho visto. Quando meu pai se aposentou, no cargo de Oficial Maior (hoje Diretor) da Secretaria Geral do Estado, apenas com a vantagem de 250$000 por mês, para não se sujeitar a humilhações políticas, no governo de Eduardo Gonçalves Ribeiro, foi imediatamente convidado por Lourenço Mello para ajudá-lo no movimento comercial de sua casa de Aiapuá. Estava eu a esse tempo (1894/1896) concluindo o curso da Escola Normal do Estado .


0 grande amigo de meu pai mandara suas filhas mais velhas Tertunilla e Antonia (Luiza, em casa) educarem-se no Pará, sob os cuidados de Marques Valente, seu amigo e compadre, chefe da firma Marques Valente & Cia. Concluídos o curso primário e o de música, essas meninas retornaram a casa paterna. Em trânsito para Aiapuá, estiveram em nossa residência, em Manaus, onde a primeira prestou concurso para o provimento efetivo da cadeira de ensino elementar daquele lago, sendo nomeada.
Em outubro de 1896, tendo eu recebido o Diploma de Normalista, pleiteei o desdobramento da cadeira mista de Aiapuá, atendendo sua excessiva frequência. Fui nomeado para a do sexo masculino, que inaugurei a 19 daquele mês e ano. Em breve me tornei genro de Lourenço , que sempre me dispensou a maior consideração e encontrava em mim companheiro nas discussões literárias, como na apreciação de problemas científicos e sociais.


Uma boa biblioteca, sempre aumentada e de obras escolhidas era uma das nossas distrações. Escolhíamos temas para estudo e discussão. As vezes, assuntos literários; outras vezes, conceitos filosóficos. E escrevíamos para jornais de Manaus.


Lembro-me de uma serie de artigos que Lourenço Mello escreveu e publicou no jornal "Amazonas", assinado "Os seringueiros" e, ainda, de um trabalho que intitulou "Os pagés", lançando um formidável ridículo nos curandeiros do interior.
A propósito desse trabalho, ouvi do Dr. Henrique Álvares Pereira, médico ilustre e então redator-chefe daquele órgao da imprensa baré, o seguinte juízo, após haver lido "Os pagés": "se este matuto andasse há mais tempo treinando aqui, nos jornais, já seria um escritor de raça". Preciso dizer que o galeno não sabia que eu era genro do chefe do Aiapuá.

Outro passatempo de Lourenço Mello consistia em cultivar a música. A flauta era o seu instrumento predileto e executava-a com emoção. Em determinados dias da semana, reunia seus irmãos Leopoldino e Nuno, estes ao violão, e tocava alguns números do seu largo repertório, após o jantar. Vi-o algumas vezes fazendo transposições, no pentagrama, para determinados tons que mais conviessem ao diapasão da flauta. Nada de oitiva. Deixou álbuns de músicas, quase todas copiadas por sua letra. Ao executar uma partitura, conservava sempre ao ombro um lenço grande, vermelho, do Aveiro, o qual, de quando em quando, passava sobre o instrumento.


Era madrugador. Levantava-se às 4 horas e, logo sentado em uma cadeira de embalo, na sala de jantar (varanda), reclamava o café. D. Felicidade, sua esposa, jamais se conformou com esse regime. Algumas vezes, fez-me despertar para conversarmos e vermos o lindo despontar do sol por trás da floresta que, ao longe, limita as águas do Aiapuá. Quando não, chamava o curumi (menino) João Ituá, seu remador e, na canoa "Piolho", assim chamada por ser chata como uma tabua, rumava para a casa de um dos seus fregueses com quem ia palestrar, até o surgir d'alva.


Lourenço Mello gostava de obsequiar a quem Ihe batesse a porta, ou formular convites a pessoas de representação. Viajantes em trânsito, no seu porto, eram quase sempre solicitados a desembarcar. Um lauto almoço Ihes era servido. Dentre diversos, recordo o ágape oferecido aos Drs. Gaspar Guimarães, mais tarde Desembargador, e Thaumaturgo Vaz, poeta de fina sensibilidade. lam eles em comissão do Governo do Estado, no aviso de guerra "Juruá", ate a cidade de Lábrea, para abrir um inquérito judicial. Tinham entrado no lago, desviando-se, assim, de sua rota, no Purus, para comprarem um rancho, o que conseguiram fartamente, sem que tudo custasse um real. De outra feita, lá esteve o almirante Jose Carlos de Carvalho, em excursão oficial ao Território do Acre. Em impressões de sua viagem, insertas no "Jornal do Comercio", do Rio, referiu-se a Lourenço Mello e afirmou "ser muito estimado por sua caboclada".


Era espontâneo, nesse homem, o espírito de gentileza e obsequiosidade. Sua casa nunca deixou de ter hóspedes que, ao se retirarem, levavam numerosas ofertas, tais como: sacos de castanha, capoeira de galinhas, doces, farinha fresca, frutas, tudo sem bajulação, pelo único interesse de ser agradável. Esse traço liberal e altruísta do seu caráter fê-lo vítima, em várias ocasiões, no trato do comércio, pois aviados seus houve que não Ihe pagaram, por esperteza, as mercadorias compradas. Dizia ele: "Deus tem mais para dar que o diabo para levar".


Em dias de dezembro de 1899, a Casa Grande esteve repleta de gente de Manaus. Lá se reuniram as famílias dos Coronéis Antonio Bittencourt e seu irmão Francisco Bittencourt, Francisco Ferreira de Lima Bacury, Eusébio Caldas e Joaquim Rodrigues Teixeira. Que satisfação imensa para Lourenço Mello e sua esposa! Quando os hospedes tomaram o navio e regressaram aquela Capital (tendo eu ficado, no meu afã escolar), não se descreve a tristeza que deixaram na fisionomia daquele homem que parece ter nascido para os grandes convívios da inteligência e do coraçao.


A casa comercial do Aiapuá tinha organização. Seu chefe não perdia um papel. A escrituração feita por ele ou por seu guarda-livros andava em dia. Terminada cada safra de castanha, de borracha ou de peixe, os fregueses recebiam suas contas-correntes, que não eram entregues sem que Lourenço Mello as conferisse.


No fim de cada ano, reunia e mandava encadernar, em volumes
fortes, pela ordem cronológica, toda a correspondência recebida. Nos "Copiadores", estava tudo que se expedia. Arquivavam-se os "Caixas", os "Borradores" e os "Razões", que se iam enchendo de escrituração. Isso vinha de alguns anos, tudo em grande armário envidraçado, que se abria e limpava constantemente.


Falecido seu proprietário, esse valioso Arquivo foi retirado e posto em caixotes, num armazém-deposito fechado. Os ratos e cupins em pouco tempo deram cabo dele. Em 1921, quando estive em Aiapuá, fui ver esse depósito. Contristava verificar a destruição completa, daquilo que tanto custara. Livros e documentos estavam reduzidos a pó...


Lourenço Mello não era somente do comércio. Prestou também bons serviços na manutenção da ordem pública, na qualidade de subdelegado de polícia do respectivo Distrito. Nunca precisou valer-se do prestígio do seu cargo para se impor aos seus concidadãos, porque, acima de tudo, pairava a sua autoridade moral, a força que é a um só tempo respeito e disciplina.


Exerceu, igualmente, por um largo período, o mister de Inspetor de índios. E, nessa função, jamais consentiu que um mura fosse maltratado. Para a legislatura de 1904-1906, foi eleito Deputado ao Congresso Amazonense. Entre as medidas que conseguiu vitoriosas, naquela Casa, esteve a melhoria da navegação do Purus, com uma linha subvencionada pelo Estado.


Lourenço faleceu a 15 de setembro de 1905, em Lisboa, em presença de sua esposa, do seu filho Wenceslau e de vários amigos. Sentindo fugir seus últimos instantes, levantou os olhos, dirigindo-se para a sua fiel e boníssima companheira de tantos anos de lutas, D. Felicidade Mello, e pronunciou: "Manda dizer ao Antonio". E baixou acabeça... Referia-se ao meu pai, que se achava em Manaus. Era o derradeiro lampejo de um homem bom, que se voltava para o seu maior amigo, na ânsia de, ainda uma vez, estreitar seus espíritos que, seguindo o caminho da luz eterna, devem estar no seio do Todo Poderoso.


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